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A.R.C.R.E., o grupo de jovens que zela pela comunidade local

Em Várzea do Douro, um grupo de jovens organiza atividades dinâmicas e promove o envolvimento da população. A solidariedade é o motor da juventude varzeense.

Foto: Grupo de Jovens A.R.C.R.E.

Na freguesia de Várzea do Douro (agora agregada às freguesias vizinhas), no Marco de Canaveses, há um grupo de jovens dinâmico, o que não se vê nas terras em redor.


Este grupo foi criado há mais de 30 anos por alguns jovens interessados na religião católica e em diversos outros temas. Começaram a reunir-se semanalmente e a planear atividades. Inicialmente, chamava-se apenas “grupo de jovens”. Só em 1996 se constituiu a Associação Recreativa e Cultural Rota da Esperança (A.R.C.R.E.), oficial e legalizada.


Em entrevista ao IMPRESSO, o presidente do grupo, Bruno Pereira, explica o funcionamento e os objetivos da associação.


A constituição do grupo


A organização é composta por jovens com, no mínimo, 16 anos ou o décimo ano de catequese completo. Neste momento, o membro mais velho tem 27 anos e anda no grupo há mais de dez.


Atualmente fazem parte da associação cerca de 50 membros, o que torna necessária a existência da “presidência”: “Como somos muitos, é preciso haver um grupo que gere melhor”, conta Bruno. A presidência do grupo tem agora oito membros, que tratam das questões burocráticas e logísticas de todas as atividades, lança propostas de coisas que o grupo pode fazer e toma as decisões mais importantes: “Quando é muita gente é sempre complicado, todos temos ideias diferentes. Decidir tudo em grupo às vezes torna-se complicado”. À medida que os membros mais velhos vão saindo da presidência, os mais novos são convidados a entrar. Normalmente são escolhidos os que demonstraram mais empenho ao longo do ano anterior. No entanto, nem todos os anos há alterações.


O presidente considera uma mais-valia haver pessoas com idades diferentes, porque todos têm pensamentos e pontos de vista diferentes e “há sempre muitas ideias”, sem que se perca a boa disposição, típica da juventude.


A sede do grupo é uma azenha antiga que estava ao abandono. O edifício pertence ao património da paróquia, que forneceu o espaço para que a associação tivesse um local onde reunir e fazer outras atividades. A azenha estava degradada e foram os fundadores do grupo que, aos poucos, a remodelaram.

Azenha, a sede do grupo. Foto: O IMPRESSO/Vânia Barbosa

O São Martinho “à moda do Grupo de Jovens”


Em Várzea do Douro celebra-se o São Martinho de uma forma especial. A A.R.C.R.E. é responsável, há vários anos, pela organização das celebrações ao santo padroeiro da terra.


Todos os anos, em novembro, realizam-se as festas em honra de São Martinho, mas a preparação começa bastante mais cedo. Entre setembro e novembro, todos os esforços são dedicados à organização e planeamento das festividades.


Para angariar fundos decorrem, durante estes meses, inúmeras iniciativas, tais como festivais da francesinha, caminhadas solidárias, torneios de sueca e futsal, venda de rifas e o peditório porta a porta. Todo o lucro destes eventos financia os artistas convidados, o material necessário, as licenças e tudo o resto que a festa envolve. Também a tradicional feira de São Martinho – normalmente, realizada na sexta-feira antes da festa –, serve para juntar dinheiro para o fim de semana que se segue.


A festa começa verdadeiramente no sábado, com uma noitada em que atuam diversas bandas e um artista principal. Nos últimos anos, Várzea do Douro contou com as atuações de cantores como Iran Costa, Toy, Quim Barreiros e Saúl. A noite de sábado termina com o “grandioso” fogo de artifício.

São Martinho em Várzea do Douro, 2017. Foto: Grupo de Jovens A.R.C.R.E.

No domingo, o dia começa com a missa em honra de São Martinho, com um tapete de flores à entrada da igreja – que o grupo de jovens deixa feito durante a madrugada, quando acabam de arrumar tudo, após terminarem as atuações dos artistas. Nesta missa, o coro é o próprio grupo, tendo um hino personalizado para este dia: “Aos céus ergamos hinos de alegria, e connosco os cristãos do Algarve ao Minho, festejamos o grande São Martinho, padroeiro da nossa freguesia”, ouve-se no refrão. Em seguida sai a procissão, em que os jovens participam, nomeadamente com a tarefa de carregar o andor.


Durante a tarde, segue o arraial no adro da igreja, com um magusto e a habitual “surpresa A.R.C.R.E.”, em que os jovens fazem um teatro. A peça funciona como sátira aos acontecimentos da freguesia desde o teatro do ano anterior. Quando a chuva estraga os planos, há que remediar e transferir a festa para o pavilhão gimnodesportivo.


Todo o processo é pensado e feito pelos elementos do grupo, que trabalham de manhã à noite durante estes dias, sem qualquer remuneração ou benefício próprio. No domingo à noite, depois de um fim de semana bem-sucedido – apesar dos imprevistos que surgem quase sempre –, o dinheiro que sobra da festa permite ao grupo jantar fora e a alegria é constante, mesmo com muito cansaço acumulado.


Em 2020, a tradição teve de ser adaptada, visto que a pandemia de Covid-19 não permitiu ajuntamentos. Desta vez, foram vendidas apenas algumas rifas e o dinheiro angariado serviu para um pequeno fogo de artifício – uma forma simbólica de marcar a data –, materiais necessários para o teatro e chegou, ainda, para distribuir castanhas assadas no final da missa.


A missa realizou-se, com algumas alterações à normalidade: o coro cantou com máscara, foi obrigatório um grande distanciamento entre pessoas e os fiéis comungaram nos seus lugares (com desinfeção das mãos antes e depois de tomarem a hóstia).


A saída da procissão não se concretizou, mas o andor foi transportado do salão paroquial até à igreja, para simbolizar o momento. Assim, todos puderam ver o andor a passar até ao altar, seguido, apenas, do pároco e dos acólitos. A vontade de realizar a festa foi maior do que as restrições e, deste modo, fez-se o possível, de forma a manter a segurança e respeitar as normas sanitárias.


Outras atividades A.R.C.R.E.


As atividades que o grupo realiza vão além da preparação desta festa. O ano do grupo é idêntico ao das escolas, começa em setembro e termina em junho ou julho. Nos restantes meses, são desenvolvidas outras atividades. Em tempos de pandemia, todas elas são adaptadas ou canceladas. Resta a esperança de regressar, em breve, à normalidade, para se voltar às festas e iniciativas coletivas. Em anos normais, a programação é bastante preenchida.


Na altura do Natal, a azenha enche-se e dá lugar ao jantar de natal A.R.C.R.E., normalmente seguido de uma troca de prendas com o popular formato de “amigo secreto”. Sempre a pensar na comunidade, a associação não esquece os mais necessitados e costuma entregar bolos-reis ou cabazes alimentares às famílias carenciadas da freguesia.


Também na época natalícia, o presépio é responsabilidade do grupo de jovens. O formato varia: há anos em que se monta um presépio dentro da igreja; noutros, a tarefa é mais dinâmica e os próprios jovens vestem-se a rigor, encarnando as personagens do presépio, e ficam espalhados pela igreja no dia de Natal e no dia de Reis.


Segue-se a Páscoa, em que a associação se encarrega de decorar a igreja para a missa de ramos, participando também na eucaristia. Nesse dia, cada membro acompanha uma criança do primeiro ano de catequese durante toda a celebração religiosa.


Uma vez por mês, o grupo de jovens marca presença na missa, assinalando o fim de semana da juventude.


Pelo meio das atividades oficiais, o grupo vai realizando pequenas festas privadas, o que é essencial para manter viva a alegria: “As amizades que se criam é que tornam as atividades que fazemos tão cativantes. Estamos entre amigos, é um espírito único”, garante o presidente. “Somos jovens, damo-nos todos bem, somos todos amigos, passamos muito tempo juntos, criamos muitos laços”, explica.


Outra característica do grupo é o trabalho constante. Regra geral, todos os sábados há uma reunião, na qual um subgrupo é responsável por debater um tema ou realizar qualquer atividade que considere útil ou divertida. As reuniões semanais reforçam a união dos membros.

Azenha, sede do grupo, onde se realizam as reuniões semanais. Foto: O IMPRESSO/Vânia Barbosa

Ainda na temática do lazer, a associação tem por hábito organizar uma viagem de dois dias a Fátima ou à Serra da Estrela, normalmente entre abril e maio. A descontração caracteriza estes passeios e, quando o destino é Fátima, a componente religiosa não é esquecida: ao domingo de manhã, os membros do grupo marcam presença na missa, que tem lugar no santuário.


Já depois de terminado o ano, é costume a realização de um acampamento de duas noites. Aqui, só a diversão importa e é tempo de usufruir de férias, após todo o trabalho dedicado à associação, que a maioria concilia com o emprego ou escola.


A relação com a Igreja Católica


O grupo foi criado de uma forma vocacionada para a Igreja, atualmente não tem só essa vertente. Além de ser um grupo religioso, é uma associação recreativa e cultural”. O que define a ligação à paróquia é o facto de a entrada no grupo ser “um caminho depois da catequese”. É o único grupo da freguesia que “acaba por dar continuidade à catequese, claro, de uma forma muito diferente, sempre adaptada aos tempos modernos e às pessoas”, realça Bruno Pereira.


Por serem jovens, às vezes não têm a compreensão de pessoas ligadas à paróquia, que “não têm a mesma visão”: “Por vezes há um descrédito em relação ao que os jovens fazem, é canalhada”. Bruno diz que, nos últimos anos, tem havido mais apoio da Igreja do que era habitual: “Agora temos um novo pároco muito jovem, com um espírito muito jovem e que já se mostrou com grande vontade de trabalhar connosco”.


A cooperação entre a A.R.C.R.E. e a paróquia – que inclui outras associações religiosas e comissões de festas – “depende muito da vontade das pessoas que estão “dentro” da Igreja” pois, apesar da religião comum, as ideias e vontades divergem. A comunidade varzeense também tem dado cada vez mais crédito ao ver que a juventude se empenha e que faz muito pela freguesia, sempre com animação e espontaneidade.


O papel do grupo na comunidade local


Bruno Pereira integra o grupo há seis anos e é o seu segundo ano no cargo de presidente. Afirma que “não há muitas associações como esta, infelizmente”.


Bruno Pereira, presidente do Grupo de Jovens A.R.C.R.E. Foto: O IMPRESSO/Vânia Barbosa

A ajuda dos familiares dos membros tem sido essencial na realização das atividades – muitos deles também passaram pelo grupo há vários anos. Os ex-membros também participam ativamente: “Agora que estão de fora veem que isto tem continuidade e ficam muito agradecidos”. A adesão das famílias dos elementos do grupo acaba por atrair a maioria da população de Várzea do Douro, que colabora nas iniciativas e se envolve cada vez mais nos projetos.


Bruno afirma que a essência de pertencer ao grupo é semelhante à do voluntariado em geral: “Nem sempre o dinheiro é o retorno do que fazemos. Aqui o retorno não é monetário mas é sentimental e espiritual. Trabalhamos por gosto”.


O gosto pela cultura e tradição da terra natal leva os jovens varzeenses a lutar pela continuidade das tradições e das iniciativas para a comunidade. O espírito jovem, a alegria, a entreajuda, o companheirismo e a amizade são os valores regem a associação, no objetivo de continuar a ajudar a população local e a paróquia.

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