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Crónica: Protegidos, mas pouco

Máscaras, desinfetantes e distanciamento social: o plano perfeito. Poderia ser se, efetivamente, fosse cumprido com rigor. Quem nunca viu uma bela máscara no queixo?

Foto: O IMPRESSO/Vânia Barbosa

A pandemia da Covid-19 trouxe consigo toda uma logística diferente no dia a dia da sociedade. Se a adaptação é fácil? Ninguém disse que ia ser, espero eu. Mas neste assunto, ninguém sabe realmente o que diz.


Começaram, então, os portugueses a sair de casa de cara tapada, que é como quem diz, estar a chegar à padaria e voltar para trás: “A máscara…”, uma e outra vez. Já passaram nove meses, umas quantas crianças foram feitas e nasceram entretanto, e continuamos a esquecer-nos da máscara.


Falemos de locais públicos ou com bastante gente. Em estabelecimentos comerciais e transportes coletivos, já todos vimos os espertos da máscara no queixo, na testa ou no braço. E já todos tivemos, também, aquela vontade forte de lhes espetar com um insulto, pô-los na rua ou colocar a máscara no sítio à capada. Sabem, aquela vontadezinha marota. Mas passa.


Já foram a restaurantes em plena pandemia, certo? Se não, vão lá dar uma ajudinha que o negócio está mau, mas não é disso que vou falar. Vou expressar a picuinhas que há em mim e explicar o momento em que desinfetam a mesa à minha frente. Adoro que o façam! Mas fica sempre um cantinho, lá no meio da mesa, em que o pano não passou. Aquele cantinho seco fica a martirizar-me durante todo o almoço. E é que eu nem ia tocar ali, mas agora não posso mesmo, não vá o vírus estar naqueles dois centímetros quadrados em que, com certeza, o cliente anterior não tocou também. A cabeça quase explode. Mas também passa, quando me levanto para sair, cheia de cuidado para não tocar numa parte da mesa em que ninguém toca.


Vi, há dias, num reality show, a chegada de uma visita do exterior. A pessoa em questão levava um fato daqueles brancos, tipo apicultor, todo tapadinho. E na cara, uma excelentíssima viseira, a uma distância considerável da cara, sem máscara por baixo. Quase consegui sentir aqueles perdigotos que caíram no imaculado chão da casa, onde meia dúzia de concorrentes estão protegidos do mundo e do vírus.


Filas… as filas têm muito que se lhe diga. Nem só as filas mas tudo o que inclui aglomerados. Acho que estou a ganhar claustrofobia em contexto específico de estar entre pessoas. Mesmo com máscaras, não dá para evitar olhar para todos os lados e empurrar os outros para trás. Em pensamento, claro, que agora não se toca em ninguém. Distanciamento social! Pesquisem na net.


Tem de ser feito aqui um destaque no que diz respeito à desinfeção das mãos. Quantas mãozitas desnorteadas não tocam nos corrimões? “Ó menina, olhe a mãozinha”, e a pessoa ainda olha de lado com um ar de “meta-se na sua vida”. A isto assisti eu, aqui há tempos. Mas há algo que me incomoda ainda mais. “Em terra de cego, quem tem olho é rei” e eu sinto-me a rainha no metro. Todos de mãozinha no ferro, isso posso aceitar, não queremos cair. Porém, o álcool tem de estar no bolso para usar ao sair! Ah, e é hora de parar de achar que o vírus só se agarra às mãos, não estão imunes por tocarem com o braço.


Podia apostar aqui um dedo, já dizia uma amiga minha, em como quase ninguém conseguiu evitar apanhar o coronavírus. Chamemos sorte ao acaso de não se entrar em contacto com superfícies contaminadas. Porque, mesmo quem acha que tem o máximo de cuidado, acaba por tocar em vários sítios antes de desinfetar as mãos. E assim, caros amigos, não vale a pena ter cuidados.


Aqui vai um conselho de amiga: imaginem, constantemente, que todos os locais em que tocam têm cocó. Se, a seguir, tocarem na roupa, na testa e na máscara e depois forem lavar as mãos, o cocó já está nesses sítios todos e, mais tarde ou mais cedo, vão voltar a tocar-lhe e nunca mais se veem livres dele. Neste caso, o cocó está lá só que não se vê, e é um vírus perigoso.


Vá pessoal, noção. Lembrem-se de que o vírus é um cocó.

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