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A escola como fator de integração

O Padre Rosas não hesita em dizer que a escola tem sido fundamental para a integração dos filhos mais novos do casal, Yazir e Maran, de sete e nove anos, respetivamente. As crianças frequentam a Escola Básica de Vila Verde, em São Pedro da Cova, e estão a ser acompanhadas por uma equipa de professoras dedicadas à sua integração e bem-estar.


Fotografia DR


“A escola tem sido excecional ”, elogia o Padre. O pároco refere ainda que os alunos da escola receberam muito bem os sírios e que, mesmo sem terem uma língua em comum, a comunicação tem fluído desde o início. “Quando as crianças se sentem bem e acolhidas, as barreiras são nulas”, diz.


Sandra Viana e Aurora Pires, as professoras das crianças, dizem que quando os meninos chegaram à escola vinham com uma postura fechada e desconfiada. Recordam que ambos protegiam-se mutuamente e só brincavam um com o outro. O tempo foi passando e, agora, cada um já está integrado na respetiva turma.


Aurora Pires dá aulas ao 1º ano, turma que Yazir frequenta. No início, o menino “chorava muito e não queria ir para a escola,” conta, e “só queria brincar com a irmã”. O pároco diz também que Yazir não tinha vontade de ir para a escola e, quando ia, tinha um apoio personalizado.

A professora diz que a maior dificuldade de integração de Yazir é a língua. Apesar de os irmãos estarem a ter aulas de português duas vezes por semana, ainda não dominam a língua, o que dificulta a comunicação com a comunidade escolar. A professora Aurora já nota progressos desde o início das aulas. “Ele já sabe distinguir e dizer as cores. Já sabe também os números em português,” refere.

A professora Aurora diz, no entanto, que mesmo existindo a barreira linguística, Yazir não é deixado de parte nas horas de lazer. “Os meninos da turma vão sempre chamá-lo para brincar, ele nunca fica de parte.” A docente conta ainda que quando Yazir começou as aulas, a turma acolheu muito bem. Os pais de um colega foram, inclusive, a casa do menino para se apresentarem e ofereceram presentes de boas-vindas.

Outra dificuldade sentida por Yazir foi a alimentação. “O Yazir chorava muito na hora das refeições. Nunca comia a comida da escola. A nossa cultura é diferente da dele e isso deve ter sido um choque,” explica. Apesar de todas as dificuldades e a integração ainda não ser completa, a docente não tem dúvidas que, agora, Yazir se sente melhor. “Ele agora está muito bem,” afirma.

Sandra Viana leciona o 4.º ano onde Maran está integrada. Recorda com muita emoção a chegada dos meninos à escola. “A primeira vez que os vi, tive vontade de chorar”, conta. Admite que já estava sensibilizada para a questão dos refugiados e que encarou a chegada dos meninos como um desafio. “Eu já estava sensibilizada para esta realidade. Quando os vi, percebi que eram crianças aparentemente saudáveis e que estavam bem. Mas pensei no que eles, com uma vida tão curta, já teriam vivido. Eles fugiram à guerra. Pensei logo no que poderia fazer por estas crianças”.


A professora Sandra explica que, aquando da sua chegada, foi pedido aos alunos que fizessem um exercício de empatia e se colocassem no lugar da menina. “Houve uma conversa de preparação. Expliquei-lhes que íamos receber uma aluna nova e que nos devíamos pôr no lugar dela. Pedi-lhes que imaginassem como seria se tivessem de ser obrigados a ir para outro país onde não conhecessem nada nem conseguissem comunicar. Disse-lhes para imaginarem que tinham de deixar a casa, os brinquedos e os amigos para trás”.


A preparação foi feita no sentido de explicar à turma a realidade de Maran, para que esta ficasse ao corrente das circunstâncias vividas pela nova colega. Maran foi integrada no 4.º ano devido à idade, e não pelo seu grau de conhecimentos. Esta decisão prendeu-se com o facto de a equipa educativa ter decidido que seria mais benéfico para a menina ficar junto de colegas da sua idade, em vez de começar no 1.º ano, o que poderia ser causa de frustração devido à diferença de interesses entre as duas faixas etárias.

A professora relata que, no início, foi feita uma avaliação para perceber o nível de escolaridade da menina. Concluiu-se que Maran falava árabe, mas não sabia escrever na língua, o que acabou por facilitar a iniciação à escrita do português, pois não possuía a noção da escrita do alfabeto árabe.

A professora Sandra reconhece que a língua é uma grande barreira à comunicação, mas entende que o processo de adaptação é lento, logo, o objetivo imediato é “trabalhar a oralidade”, para que Maran consiga integrar-se e “comunicar com os pares”. Com o foco na comunicação do dia a dia, a docente utiliza o “método das 28 palavras”, que consiste na formação de várias palavras com as sílabas de uma só palavra. Na visão da professora, este método é bastante adequado para a comunicação diária com toda a comunidade escolar.

Maran já sabe dizer várias palavras: menino, nome, caneta, são alguns exemplos. A professora realça que “mais importante do que escrever em português, é ela comunicar e sentir-se feliz na escola”. Sandra Viana destaca a atitude de Maran no processo de aprendizagem. “É uma menina muito interessada, com muita vontade de aprender”.

A docente elogia a atitude da turma em relação a Maran. “Todos eles vibram com as conquistas da Maran. A cada palavra em português que ela diz, os olhos deles brilham. Toda a gente bate palmas. É um envolvimento maravilhoso. Nunca vivi uma situação destas. estou maravilhada”.


Na visão da professora, o facto de a turma ter de lidar com uma colega de um contexto diferente e passado difícil, pode contribuir para a formação das crianças e torná-las mais conscientes e atentas em relação à diferença e às dificuldades do outro.


Sonhos por realizar

Os Baytar abandonaram a Síria mas não esqueceram os sonhos. Apesar de terem deixado para trás uma história, a família está determinada em continuar a lutar por uma vida melhor. Os rapazes, Ibrahim, Mohammed e Bilal querem, no futuro, ter uma casa e constituir família em Portugal. Mohammed tem o sonho de ser jogador de futebol, enquanto Ibraim gostava muito de montar um ginásio e o pequeno Yazir tem o mesmo sonho que o irmão mais velho. Maran quer ser pintora. “Quero fazer muitos desenhos”. Bilal, para já, deseja aproveitar a estadia em Portugal.

O maior anseio do casal é a reunião total da família, já que a filha, Fatima, ficou na Síria. O patriarca gostaria de dar continuidade, em solo luso, ao negócio que deixou em Alepo.

Nenhum dos Baytar pretende voltar para a Síria. Visitar o país que abandonaram está no projeto da família, mas só quando houver segurança. “Aqui somos muito felizes. Os mais novos vão à escola. Estamos seguros,” remata Mahmood.


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